Audiência pública debate perspectivas e desafios das pessoas com transtorno de espectro autista

Audiência pública debate perspectivas e desafios das pessoas com transtorno de espectro autista

A Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) promoveu, na tarde de terça-feira (1º), no Plenário das Deliberações Deputado Renê Barbour, a primeira audiência pública com o tema “A realidade, as perspectivas e os desafios das pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA)”.

A audiência, solicitada pelo deputado estadual Wilson Santos (PSD), foi realizada em alusão ao Dia Mundial de Conscientização do Autismo, celebrado em 2 de abril. O evento também teve como objetivo dar espaço às vozes de mães e cuidadores de pessoas com autismo. Cerca de 250 pessoas estiveram presentes, incluindo representantes de autoridades municipais, estaduais e federais, além de entidades que lutam pela inclusão e assistência às pessoas com dificuldades no neurodesenvolvimento.

O deputado destacou que realiza anualmente o simpósio “Autismo em Mato Grosso – do Diagnóstico ao Tratamento” e que desde 2020 lidera o projeto “Despertar para o Autismo”, que busca disseminar informações sobre o tema em comunidades, igrejas e escolas, promovendo uma sociedade mais inclusiva.

“Essa audiência foi mais do que um debate. Foi um espaço onde pudemos sentir a dor, a luta e as experiências daqueles que enfrentam, diariamente, os desafios de conviver com o diagnóstico de autismo em suas famílias”, afirmou o parlamentar. Santos enfatizou que é essencial fortalecer as políticas públicas voltadas para pessoas neurodivergentes, garantindo inclusão social, proteção de direitos e uma sociedade mais igualitária.

Juliana Fortes, presidente do Instituto Psicossocial Renascer do Autismo (IPRA), afirmou que a audiência representa um apelo da comunidade autista por atenção e medidas concretas. Ela explicou que o IPRA foi criado para apoiar mães atípicas que enfrentam sobrecarga emocional, perda de qualidade de vida e dificuldades financeiras. Juliana relatou que começou a buscar o apoio do deputado Wilson Santos em 2019 e que sua atuação, bem como a do Legislativo, tem contribuído para a causa. No entanto, ainda há muito a ser feito, pois, segundo ela, as políticas públicas voltadas para pessoas com TEA avançam lentamente no estado de Mato Grosso.

“Existem leis, mas elas precisam ser colocadas em prática. Hoje, as mães que participaram da audiência vieram, mais uma vez, pedir soluções para o caos que enfrentamos nas áreas de saúde e educação, devido à falta de políticas públicas efetivas e, mais do que isso, à ausência de sensibilidade humana”, desabafou Juliana. Ela também ressaltou que mesmo famílias com recursos financeiros enfrentam dificuldades, dada a carência de profissionais qualificados para realizar o atendimento, acolhimento e tratamentos adequados.

“Agora imaginem quando o autista nasce em uma família em situação de extrema vulnerabilidade?”, questionou Juliana, que também é mãe de uma criança com autismo. Ela destacou que a audiência pública pode abrir novas possibilidades dentro do Sistema Único de Saúde (SUS), que atualmente oferece consultas, mas ainda não disponibiliza o tratamento interdisciplinar necessário para que essas pessoas desenvolvam as autonomias que precisam.

Mãe de quatro filhos autistas, Julien Stefani da Silva Carmo, reclamou que está há cinco anos aguardando na fila de espera. “Está difícil conseguir atendimento no SUS. É muito complicado conseguir terapia ocupacional, fonoaudiólogo e psicólogo”, lamentou Julien. “Espero que, através desta audiência, venha acontecer melhoras não só para mim, mas para as outras mães”, completou.

Gabriela Escouto, mãe de uma criança de um pouco mais de três anos que também faz parte do espectro, disse que está lutando há mais de um ano para conseguir acompanhamento para a filha.

“Não consegui nada até hoje no SUS. Eles sempre alegam que não tem vaga, que não tem profissional, que há muita gente na fila de espera e que não tem data prevista para atendimento”. Diante da situação, Gabriela disse que foi nesta semana pedir intervenção da Defensoria Pública do Estado.

Inclusão escolar – Na audiência também foi enfatizada a questão da criança com autismo na escola de ensino regular. Professores explicaram que o aluno autista tem direito a um professor especializado, que é o PAP (Programa de Apoio Pedagógico), porém, neste ano de 2025, a Secretaria de Educação Estadual (Seduc) começou a negar esses professores em sala de aula e que isso está causando um transtorno grande, uma revolta na sociedade, porque o aluno fica desamparado. Quanto a essa questão, o deputado disse que irá enviar todas as demandas para a Seduc e cobrar as providências necessárias.

A deputada estadual professora Marildes Ferreira (PSB) avaliou que a audiência contribui justamente para a discussão das políticas públicas. “Porque as políticas públicas e as leis existem, mas, de fato, elas não alcançam essa população, que merece atendimento em tempo real, humanizado. Um dos assuntos que me chamou muito a atenção foi a questão da educação. A gente conseguiu perceber como o Estado ainda está omisso dentro das prerrogativas que a lei determina como, por exemplo, que um autista em sala de aula tenha um acompanhamento especializado. E isso este ano, segundo o relato de todas as mães ali, foram retirados dos seus filhos. Então, a gente precisa unir essas forças na Assembleia Legislativa para abraçar a causa dessas mães”, enfatizou.

Interdisciplinaridade – Como médico, o deputado Lúdio Cabral do (PT), explicou que o que falta para o Estado começar a ter um encaminhamento melhor de assistência e até de diagnóstico, é exatamente diagnóstico, porque é um problema complexo que exige abordagem de psicólogos, de psicopedagogos, de pediatras, de neuropediatras, de terapeutas ocupacionais.

De acordo com Lúdio, é necessário um conjunto de profissionais para assegurar o diagnóstico correto e no tempo certo, para a partir daí as portas do sistema de saúde se abrirem para o atendimento. “Agora se o sistema de saúde, se tem precariedade para a diagnóstica, tem precariedade infelizmente em todas as outras áreas. Porque o cuidado da pessoa com transtorno do espectro autista exige um processo de abordagem contínuo, permanente, por uma equipe multiprofissional em unidades básicas de saúde, em centros de reabilitação, em ambulatórios especializados. Portanto, não é uma tarefa simples e o sistema de saúde precisa se preparar para dar conta disso. As equipes de saúde precisam ser capacitadas, preparadas para o diagnóstico precoce, para a identificação dos primeiros sintomas. E a rede de serviços precisa se organizar para acolher com a qualidade necessária as pessoas que estão no espectro autista”, contextualizou o petista.

Com empatia, primeira-dama de Cuiabá e vereadora Samantha Íris (PL), que também tem um filho de 4 anos, que há dois foi identificado como autista, disse que ouviu cada relato com muita atenção. Em nome do prefeito Abílio Brunini (PL), o qual a vereadora também representava no evento, Samantha afirmou que enquanto gestão de Cuiabá, eles estão buscando informações para trabalhar a questão.

“Nós estamos neste lugar de gestão de Cuiabá há exatos 90 dias, então são 90 dias que a gente busca entender como ajudar para que essas audiências, esses momentos não fiquem apenas aqui como uma audiência, mas que saiam soluções”, afirmou.

A audiência pública contou com a presença de representantes do Ministérios da Educação e dos Direitos Humanos, Defensoria Pública, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Mato Grosso, Secretarias Estaduais de Educação (Seduc) e Saúde (SES), Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Conede), Prefeitura e Câmara Municipal de Cuiabá, Promotoria de Justiça, Centro de Referência de Assistência Social (Cras) e prefeituras municipais de diferentes municípios, associações e instituições que atuam com o público autista.

O evento foi gratuito e aberto ao público, com emissão de certificados de participação. A audiência foi transmitida pelos canais de comunicação da Assembleia Legislativa no YouTube, Facebook e pelos canais 30.1 e 9.2 da TV Assembleia. Representantes de 10 municípios se fizeram presentes.

Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo – Em alusão à data que é celebrada nesta quarta-feira (2), com o intuito de reforçar a importância da inclusão, do respeito e da compreensão, sensibilizando a sociedade sobre os desafios enfrentados pelas pessoas autistas e suas famílias – será realizada no saguão da Assembleia Legislativa uma feira organizada por pessoas ligadas aos movimentos de luta pelos direitos das pessoas autistas.

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